Desde o resultado da eleição presidencial de 2022, que levou Lula (PT) à chefia do Executivo nacional, vários movimentos vêm ocorrendo, principalmente após o segundo turno. Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL), que foi candidato à reeleição, têm participado de ações diversas mostrando insatisfação com a condução do processo eleitoral e com o resultado das urnas. Entre as ações, na semana passada ocorreram protestos em rodovias. Há também, em algumas cidades, convocações para manifestações nas portas de quartéis e pedidos de intervenção federal.
Boicote
Um movimento que já havia sido registrado em outras cidades chegou a Lafaiete. Foi formulada uma lista de comércios, que seriam de “esquerda” com o pedido para que haja um boicote nos estabelecimentos. A lista foi feita de maneira anônima. Mas tem incomodado muita gente, por prejudicar quem empreende e gera emprego na cidade.
Rosilene Bandeira, é coordenadora da Associação Cantinho do Artesanato, que realiza uma feira na praça São Sebastião, visando a economia solidária, para que pessoas que fazem sua arte em casa consigam apresentar e vender suas obras. A associação teve o nome incluído na tal lista: “Nesta semana, recebemos de várias pessoas, falando desta lista falando dos comércios de esquerda de Conselheiro Lafaiete e ficamos muito tristes e muito chateados também. Nós estamos há um ano fazendo este trabalho em Lafaiete, para ajudar as pessoas, ajudar as famílias a ganharem uma renda e colocam a gente nessa situação”, desabafa.
A história
A professora Érica Araújo, fez uma carta aberta aos lafaietenses sobre o assunto. Ao Fato Real ela comentou sobre o episódio evocando a luz da razão, a história e o bom senso: “Vamos recordar a Noite dos Cristais, acontecida entre os dias 9 e 10 de novembro de 1938, na Alemanha quando, por ordem do governo de Hitler, comércios de judeus alemães foram atacados e depredados como a culminância de um grande boicote para arrasar com esse povo. […] Listas como essas são uma verdadeira caça às bruxas, colocando vizinho contra vizinho, com inspirações históricas bem perigosas. É o oposto da Democracia que apreciamos e queremos manter. Desconfie desse tipo de listagem, desconfie de quem as compartilha e se pergunte sempre: qual o objetivo de quem quer prejudicar o comércio local, a circulação de dinheiro dentro da cidade e o sustento das famílias? Qual o objetivo de causar esse tipo de desordem?”, diz parte da publicação.
Em outro trecho a professora diz: “Existem os aspectos jurídicos a serem considerados tanto para quem faz quanto para quem compartilha esse tipo de lista – existe a possibilidade de processo por difamação e por danos morais. Então se vê que o mundo adulto não é de brincadeiras e as ações possuem consequências. Da minha perspectiva, quando analisamos o campo ético e o político a coisa se agrava em primeiro lugar porque CNPJ não tem título de eleitor e, portanto, não vota. Os empresários locais muitas vezes, procuram não conectar preferências políticas aos seus negócios justamente porque precisam atender a todos. Porém, é importante pensar: se CNPJ não tem título, emprega CPFs que possuem sendo essas pessoas de vários alinhamentos políticos. É, uai. Na democracia é assim: você não coloca no seu currículo se é direita ou esquerda. Uma lanchonete, um bar, uma marmoraria – ou outra loja de sua cidade – empregam gente que vota em Lula, que vota em Bolsonaro – ou que não vota em nenhum dos dois. É importante pensar também que os donos desses CNPJs possuem, como cidadãos o direito de se expressarem politicamente e em um Estado democrático de direito, eleitores de A ou B não podem ser punidos por terem essa ou aquela preferência política do campo da democracia – mesmo que eu discorde dela”.
Cláudio
Na cidade de Cláudio, além de incitar o boicote a profissionais que supostamente apoiaram Lula, a listagem contém “relatos homofóbicos, de cunho difamatório e injurioso”, e o caso foi denunciado à polícia. Assessorado por um advogado, o grupo aguarda uma investigação para se chegar aos autores ou autor da lista.
O advogado Luiz Guilherme Terra aponta os crimes de difamação, injúria, além do previsto na Lei 7.716/89 que define os resultantes de preconceito de raça e cor. Além disso, pela proposta do boicote que pede que a população não compre nas lojas citadas, na esfera cível, deverá ser requerida indenização.
A Polícia Civil de Cláudio disse que tomou conhecimento do caso e que está tomando as medidas cabíveis.
